O 18º Acampamento Terra Livre (ATL), existente desde 2004, é embalado pelo som do caminhar e pela batida do maracá, que com a coroa de cocar, adereços a se balançar e corpos banhados de jenipapo a se movimentar, marcham em direção ao Congresso Nacional, em Brasília, Distrito Federal. A mobilização carrega como tema o “Demarcar Territórios e Aldear Política” ,que além das lutas pela defesa da terra e as pautas do extermínio, abre um chamado para as lideranças indígenas lançarem candidaturas por todo o território brasileiro, o que permite a voz indígena debater sobre projetos que interferem diretamente na vivência indigenista.
O ATL iniciou no dia 4 de abril e se estenderá até o dia 14 do mesmo mês, esse também é o período em que o Congresso Nacional e o Governo Federal pautam a votação de projetos que violam os nossos direitos, como por exemplo, o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que abre os nossos territórios para a exploração de minério.
A mobilização de 2022, que reúne representantes dos 305 povos do Brasil, está instalada no complexo da Fundação Nacional de Artes (Funarte), localizado no Eixo Monumental, do Distrito Federal, lugar onde ocorre ataques aos nossos direitos, o que nos leva ao confronto desta política de ódio, pensada para nos exterminar por meio de projetos, que tramitam de portas fechadas no Congresso Nacional, lugar tomado pelos não indígenas.
Estamos lutando contra a agenda anti-indígena, composta por projetos que invalidam as nossas vivências e ferem os direitos que nos foram garantidos na Constituição de 1988. Tais como, o projeto de lei 490/2007, que determina o fim das demarcações, o PL 6.299/2002, que facilita o uso de agrotóxicos, PL 2.633/2020 e o PL 510/2021, incentivadores da grilagem e o PL 3.729/2004, que trata do licenciamento ambiental. Lutamos também por espaço dentro da política brasileira, por meio de candidaturas indigenistas que nos possibilitaram um futuro indígena.
Há dois anos realizando o ALT no formato virtual, devido a pandemia da Covid-19, este ano estamos de volta ao fervor das ruas, levantando nossas vozes em detrimento da vida, da existência, da permanência e do direito de ter direitos. Queremos chacoalhar a capital do poder e levar a eles a mensagem de que o Brasil é nosso, já estávamos aqui quando eles chegaram, somos anfitriões das terras brasileiras e merecemos ter o nosso espaço demarcado e o nosso povo representado dentro dos espaços políticos.
A 18º edição do ATL, assim como as anteriores, é feita por nós, indígenas, vindos de aldeias ou de cidades, somos Tupinambá, Yanomami, Guajajara, Tembé, Kaiova, Tupiniquim, Karipuna, Guarani e outros tantos. Somamos com as organizações de base, e de cabeça erguida, caminhar atento e de olhos bem abertos, soltamos o grito firme na luta por garantia de direitos e libertação de um poder anti-indígena. Que ataca principalmente, nós, mulheres ancestrais. Nossa luta é contra os ataques de ódio, o fascismo, o machismo e o sexismo. O nosso esperançar está na certeza de que não estamos sós, nossos parentes dizimados se juntam a nós nesse andejar em busca de um Brasil com um rosto indigenista.
Por meio de carta, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), uma das organizadoras do ATL, destaca, há uma tentativa incessante de aplicação de projetos de morte contra nossos territórios e vidas. Uma das propostas centrais do atual governo federal é a abertura das terras indígenas para exploração em grande escala de mineração, hidrelétricas e grandes projetos de infraestrutura. O PL 191/2020 é um dos principais instrumentos dessa política de destruição, o qual tem sido apresentado como prioridade legislativa do governo federal desde o seu início. Estamos enfrentando pautas urgentes que ameaçam nossas vidas e tradições. A demarcação dos nossos territórios segue como bandeira principal, de forma que a defesa pela vida contra a agenda de destruições é nossa prioridade.
Não somente de lutas somos feitos, mesmo que na maior parte do tempo a gente precise ser. Os 11 dias do ATL, são também banhados por pinturas, sonorizados por cantos embalados pelas danças ancestrais, que trazem culturas, histórias, costumes e uma amostra encantadora da identidade e da essência da nossa gente.
Chegamos ao quarto ano de um (des) governo genocida, perdemos parentes e fomos atacados inúmeras vezes por uma política criminosa conduzida por Jair Bolsonaro, o homem do extermínio. Mas não nos calaremos, declaramos o fim do governo bolsonarista, pelos nossos ancestrais, por nós e por quem ainda virá, o futuro é indígena!
Histórico de lutas
A repressão tentou intimidar nossos povos durante a última edição presencial do ATL, que ocorreu em 2019. Um dia antes, o atual presidente, liberou uma portaria autorizando o uso da Força Nacional na Praça dos Três Poderes e na Esplanada dos Ministérios, lugar em que se concentravam cerca de 10 mil originários. Mas a medida não foi capaz de nos silenciar, em setembro de 2021, somamos seis mil indígenas acampando na porta do Supremo, em vigília contra o Marco Temporal.
Brasília vai ser tomada por indígenas sim, vamos nos fazer presentes no lugar que decide o nosso futuro sem nos consultar e fazer dele palco de mobilizações das nossas lutas, seja no Levante pela Terra, no ATL ou em qualquer outra manifestação que tenha finalidade de manter viva a nossa existência.
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