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Transporte público em Belém: Pagamos um preço justo?



Mesmo diante da crise sanitária, econômica e social que ainda estamos vivendo. A população belenense foi surpreendida na semana passada com o pedido de aumento da passagem do coletivo pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros (Setransbel), órgão que representa as empresas de ônibus da capital.

A tarifa de ônibus custa hoje R$3.60, a Setransbel pediu aumento para R$ 4,87, que representa R$ 1,27 a mais se for aprovado. Será mesmo justo?


Vamos aos números e cálculos de acordo com o bolso dos usuários. O aumento pedido pelos empresários, caso atendido, representaria um gasto mensal de R$ 214,28 para uma trabalhadora ou trabalhador que precisa usar dois ônibus por dia, de segunda a sexta, um aumento de R$ 55,88 a mais no salário ao final do mês. O valor representa 20,47% do salário mínimo que é de R$ 1.100. Para quem pega quatro ônibus por dia, o valor mensal de segunda a sexta, seria de R$ 428,56. Já quem trabalha de segunda a sábado gastaria 506,48 reais, cerca de 46% da renda mensal de quem ganha um salário mínimo.


O último aumento foi em 2019, antes da pandemia, o Setransbel alega que “a capital paraense tem a segunda menor tarifa dentre todas as cidades do Brasil”. De fato, é uma das mais em conta, mas o Sindicato dos empresários esquece de dizer que também Belém tem uma das menores renda per capita do país, chegando a 883,00 de acordo com dados do IBGE de 2020. O sindicato também não leva em consideração a opinião dos usuários, que consideram a frota de Belém umas das piores e mais sucateadas do brasil.


O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos do Pará (Dieese/PA) afirma que o reajuste na tarifa de ônibus de 35,28%, proposto pelo Setransbel à Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (Semob) está bem acima da inflação estimada em torno de 14% para o período de junho de 2019, quando houve o último reajuste, até o mês de agosto de 2021.



A pedagoga Rayana Santos, faz o trajeto da avenida Nazaré para o conjunto cidade nova, em Ananindeua, e fala da condição dos ônibus na cidade “é muito complicado, os ônibus parece que vão desmontar a qualquer lombada que passa, quando chove parece que vai molhar mais dentro do ônibus que fora, além de demorar muito para passar, as vezes a gente passa 40 minutos no ponto de ônibus”. Rayana faz esse percurso todos os dias de segunda a sexta.


Nas últimas semanas as reclamações de usuários têm crescido nas redes sociais devido a retirada de algumas linhas de bairro como o Conjunto Maguari, Paracuri e II, no distrito de Icoaraci, em Belém, fila quilométrica se formou a espera do ônibus. Linhas desativadas sem aviso prévio, superlotação e frota de ônibus insuficiente para atender a população já fazem parte da rotina de todos que residem nesses locais.


As empresas de ônibus fazem a retirada desses linhas sem o menor estudo prévio do impacto que isso pode causar na rotina dos usuários, que está acostumado a pegar a condução nos horários de consumo.


José Agostinho,58 anos, chefe de segurança de obras, diz que o aumento é absurdo “Eu pego 4 ônibus para ir ao trabalho, dois de ida e dois de volta, e toda semana tem algum transtorno, o ônibus fica prego, ou não passa no horário, pegamos transporte imundo, as vezes sujamos nossa roupa quando sentamos no assento. Agora querem que eu pague quase 5 reais pra andar em um ônibus desse? É um absurdo”. Segundo relato de José Agostinho, o aumento da passagem vai trazer um grande impacto financeiro em sua casa “Já tá tudo caro no mercado, ovo, carne, legumes, com o aumento da passagem vai ficar ainda mais difícil fazer o mercado todo mês”.


DIFERENÇA PARA OUTRAS CIDADES DO BRASIL


Caso haja esse aumento Belém vai ser a segunda capital com passagem mais cara do país, atrás somente de Brasília, que cobra R$5 reais, mas com 100% de gratuidade para estudantes.


Diferente de muitas cidades do Brasil, em Belém a passagem é paga por ônibus, não existe a chamada “integração,” uma realidade de muitas cidades. A integração permite que o passageiro use a mesma passagem caso precise ir para um lugar mais distante e precise utilizar mais de um ônibus. Quando vamos para o nosso trabalho, nem todo ônibus que sai do seu bairro vai direto para o ponto do seu trabalho e há necessidade ter que pegar outro ônibus, se existisse integração, essa pessoa pagaria o preço de uma única tarifa. Além disso, essa vantagem é uma realidade em algumas cidades brasileiras, que usa o bilhete único (disponível para os moradores de São Paulo que pagam R$4,40) ou da integração entre modais diferentes (realizada em Fortaleza por R$3,60).



Por aproximadamente o mesmo preço, R$4,80, Porto Alegre opera um sistema com aplicativo para localização em tempo real, com horários estimados por GPS, o que facilita o planejamento de quem depende do transporte público e precisa se organizar ao longo do dia. Além disso, 47% da frota da capital gaúcha é climatizada, apesar da temperatura média da cidade oscilar entre 23 e 13 graus celsius em setembro. Há ainda um sistema de reconhecimento facial em 100% dos veículos e 91,4% dos veículos possuem instalação de plataforma elevatória.


São Luís possui tarifa de R$3,20 para linhas não integradas, por exemplo, e de R$3,70 para linhas integradas, enquanto Recife conta com um sistema que permite baldeações para troca de veículo sem cobrança de uma nova passagem por R$3,75. Em Belém, dois trajetos custam R$7,20, sempre. Além disso, na capital pernambucana, os usuários podem pagar apenas metade da tarifa fora dos horários de pico - 9h às 11h e 13h30 às 15h30. Já Maceió, que cobrava R$3,65, passou a cobrar R$3,35 neste ano - ou seja, promoveu uma redução na tarifa mesmo diante dos revezes da pandemia de covid-19.


Quem lembra em 2017 os vereadores votando contra o Projeto de Lei que obrigaria as empresas de ônibus instalarem aparelho de ar-condicionado nos coletivos da cidade? Dos 35 vereadores, 21 compareceram à sessão. 18 (dezoito) parlamentares votaram contra, apenas 3 (três) votaram a favor, 5 (cinco) estavam licenciados enquanto 9 (nove) faltaram, e o projeto não foi aprovado.


O transporte coletivo é uma é uma concessão pública, contudo, o debate sobre a gestão do transporte público é sempre decidido pela minoria de empresários que comandam os ônibus, e possivelmente não sabem ou desconhecem o que o povo passa nos transportes precários. Então os empresários tem que oferecer um serviço de qualidade.


Caso haja este aumento, vai continuar com um serviço de péssima qualidade? Calor, ônibus quebrado, horas esperando e muito estresse, sendo a segunda capital com a tarifa mais cara do Brasil.

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